Memórias da Estação - O lenço
Sentado no meu banco de costume, de chapéu na cabeça e paletó alinhado, acabei de ler meu jornal e reparei em um casal que chegava à estação. Ambos moços, de braços e corações dados, o jovem carregava uma valise Samsonite, de couro marrom e com detalhes em bronze, um tanto desgastada é verdade, mas ainda sim, conservada.
Ela com um vestido de chita florido e ele com um terno claro e chapéu panamá, muito bem alinhado, mas era possível ver tão somente um bilhete na mão do rapaz, a qual dos dois pertenceria, eu só viria a saber no momento do embarque.
Entre trocas de olhares, sorrisos e suspiros, eles se abraçavam rapidamente, talvez obedecendo os costumes do lugar e, infelizmente ao meu ver, deixando de permitir que dois corações batessem mais próximos um do outro. Acontecia ali um ritual de sutil despedida.
Para mim, que esperava por alguém, o trem demorou a chegar, para eles, que se realizavam um intervalo breve de verem-se um ao outro, o trem chegou muito rápido.
Eles se abraçaram longamente, e eu pude ler nos lábios dele:
— Espere por mim!
Entregando-lhe um lenço com detalhes em flores, a moça tornava concreto o sentimento de esperança. Sim, aquele pequeno pedaço de pano não servia mais como adorno ou item de higiene, ele era agora um símbolo, um elo de esperança num reencontro próximo. Naquele quadrado de tecido, estava representado todo um sentimento que outrora fora abstrato. E de dentro do vagão, da janela, enquanto o trem começava a sua partida, o jovem balançava o lenço para sua amada, como uma bandeira cintilante, o símbolo do retorno breve.
Ao ver a cena, e após a máquina de ferro sumir no horizonte, deixando apenas um rastro de fumaça no céu, testemunhei a moça derramar uma lágrima. Automaticamente levei a mão ao bolso, para lhe oferecer um outro lenço, a fim de secar o sentimento que se liquefazia. Contudo, o lenço que retirei do bolso era também um símbolo para mim, não de esperança, mas de saudade.
Ninguém de cabelos vermelhos desceu na plataforma 29, e a minha saudade feita em pano voltou para o bolso do paletó, próximo ao coração.

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